sábado, 28 de abril de 2012

A fortaleza do Pastor...

'O Senhor conhece Suas ovelhas...'

Os Bispos do Brasil, reunidos recentemente em Assembleia, mais uma vez se debruçaram sobre o valor infinito da Palavra de Deus, desejando transmiti-la sempre e com crescente profundidade ao povo de Deus. A Palavra de Deus é fonte inesgotável de vida para toda a humanidade. Como sempre faz, a Igreja quer empreender de novo, com crescente zelo, o anúncio da Palavra, que tem seu lugar privilegiado, para animar a vida de todos e o serviço apostólico a ela confiado. A chave que abre a porta da Sagrada Escritura é Nosso Senhor Jesus Cristo, com Sua Morte e Ressurreição, o mistério pascal que celebramos nos tempos correntes.

Amar e conhecer a Cristo é nosso dever, nossa honra e nossa alegria, deixando-nos provocar por Ele! A presença de Jesus suscitou e suscitará sempre interrogações e muita perplexidade. Nós o sabemos verdadeiro Deus e verdadeiro homem e podemos encontrar, além da graça redentora que só pode chegar por intermédio d'Aquele que é Caminho, Verdade e Vida, a referência de valores a serem assumidos para uma vida plenamente humana e digna. A Igreja nos convida a olhar sempre para o Senhor, seguindo-O de perto para fazer tudo o que Ele nos disser! Aproximemo-nos do Cristo Ressscitado e da riqueza de Sua personalidade. Em Nazaré, onde Jesus fora criado, as pessoas se interrogam a respeito d'Ele: “De onde lhe vêm essa sabedoria?” (Mt 13, 54).

Noutra ocasião, “surgiu uma divisão entre o povo por causa dele. Alguns queriam prendê-lo, mas ninguém lhe pôs as mãos. Os guardas então voltaram aos sumos sacerdotes e aos fariseus, que lhes perguntaram: Por que não o trouxestes? Responderam: Ninguém jamais falou como este homem” (Jo 7,43-46). Suas palavras, mais doces do que o mel, atraem as pessoas, mesmo quem tem a tarefa de prendê-Lo. Tantas vezes quantas forem lidas, acolhidas e vividas, nelas se encontra a vida eterna. Seu som se espalha e ecoa por todo o universo. Se buscarmos outro valor, como a beleza, aqui está: "Tu és o mais belo entre os filhos dos homens, sobre teus lábios difunde-se a graça (Sl 144,3)". “A Igreja lê o salmo cento e quarenta e quatro como a representação poético-profética do relacionamento esponsal entre Cristo e a Igreja. Reconhece Cristo como o mais belo entre os homens; a graça sobre os lábios indica a beleza interior da sua palavra, a glória do seu anúncio. Assim, não é apenas a beleza exterior da aparição do Redentor a ser glorificada: nele aparece muito mais a beleza da Verdade, a beleza do próprio Deus que nos atrai a si e ao mesmo tempo nos causa a ferida do Amor, a santa paixão (“Eros”) que nos faz ir ao encontro, junto e com a Igreja-Esposa, ao Amor que nos chama” (“Beleza de Cristo”, Joseph Ratzinger/ Bento XVI).

Na festa do Bom Pastor, celebrada pela Igreja no Quarto Domingo da Páscoa, é possível descortinar algumas características da personalidade de Jesus (cf. Jo 10,1-18). O Evangelho de São João apresenta três belíssimas parábolas, que vieram a ser consideradas como “Parábola do Bom Pastor”, no quadro do difícil confronto de Jesus com adversários ferrenhos que O pressionavam. De fato, as palavras do Senhor “causaram nova divisão entre os judeus” (Jo 10,19). A imagem utilizada por Jesus é a do pastor de ovelhas, rica de significado para o ambiente em que se encontrava, mas ainda atual em nossos dias. Ele é a porta das ovelhas: “quem entrar por mim será salvo; poderá entrar e sair, e encontrará pastagem” (Cf. Jo 10,7-9). Portas abertas, clareza para expressar as coisas, nada de complicações! Todos se impressionam com gente assim e se sentem atraídos! “Conheço as minhas ovelhas e elas me conhecem” (Jo 10,15). Ele conhece cada uma das ovelhas pelo nome (cf. Jo 10,3), é capaz de estabelecer relacionamento pessoal, não apenas com a massa! Todos são importantes para Ele e suas necessidades ressoam em Seu coração. “Eu sou o bom pastor.

O bom pastor dá a vida por suas ovelhas” (Jo 10,11). Bondade e entrega de vida. Só quem é plenamente realizado e feliz pode chegar a tais alturas, pois é Aquele que veio “para que tenham vida, e a tenham em abundância” (cf. Jo 10,10). Jesus Cristo, acolhido e amado, oferece tudo o que as pessoas de qualquer tempo procuram. Jesus olha longe, num grande horizonte aberto: “Tenho ainda outras ovelhas, que não são deste redil; também a essas devo conduzir, e elas escutarão a minha voz, e haverá um só rebanho e um só pastor” (Jo 15,16). Portas e janelas abertas, os confins da terra.

O universo inteiro, sem fechamentos e exclusivismos! N'Ele, Nosso Senhor Jesus Cristo, está nossa vida e nossa missão. Hoje é o nosso tempo para conhecer Sua voz e seguir Aquele que vai à nossa frente (cf. Jo 10,4). Entretanto, sendo limitados, parece-nos muito alto o ideal: dar a vida, conhecer pelo nome, dar exemplo, ir à frente dos outros, abrir-se para todos, enfim, acolher e espelhar a beleza e a bondade do Pastor! Sabendo disso, a Igreja nos leva a pedir com confiança: “Deus eterno e todo-poderoso, conduzi-nos à comunhão das alegrias celestes, para que o rebanho possa atingir, apesar de sua fraqueza, a fortaleza do Pastor”. Assim seja!

Dom Alberto Taveira Corrêa

quinta-feira, 19 de abril de 2012

A força do amor...

'Maria Madalena nos ensina a sermos movidos pelo amor...'

Era bem de madrugada, ainda escuro, o silêncio e o frio daquele amanhecer denunciavam que algo diferente estava para acontecer. Madalena, no entanto, continuava a caminho, rompendo a escuridão da madrugada com passos apressados; ela tinha um destino certo. Seu coração, tomado pelo amor, não se deixava abalar nem mesmo pelos comentários das companheiras; para ela, eram ecos de preocupações momentâneas que não vinham ao caso: – "Quem vai tirar a pedra do túmulo?" Dizia uma. – "E os soldados romanos, o que vamos dizer para eles?" Comentava outra.

Madalena, no entanto, seguia em frente, era movida pelo amor, quem a poderia deter? Seu destino era o túmulo do amado Mestre. Queria prestar-Lhe a última homenagem, estar perto d'Ele e amá-Lo do seu jeito, como sempre inovador. Sim, ela sabia mais do que ninguém que Ele estava morto. Acompanhou Seus últimos passos neste mundo, esteve aos pés da cruz quando ele foi crucificado, viu onde colocaram Seu Corpo sem vida. Para ela não havia dúvidas, o Mestre estava morto e sepultado!

Mas é a força do amor que faz Madalena sair de madrugada, enfrentando o clima de perigo e perseguição daqueles dias, quando até os discípulos mais próximos de Jesus estavam escondidos e temerosos. Será que essa mulher de fé também não sentia medo, visto que seu Senhor já não poderia defendê-la das pedradas e julgamentos como fizera outrora? Provavelmente sim, mas o amor supera o medo!

Basta lembrarmos quantas vezes na vida já enfrentamos situações de perigo por esse sentimento nobre. Aliás, já foi muitas vezes provado que o “amor é a força mais poderosa que existe." Por isso ele supera também o medo. Diz a Palavra que, quando Maria Madalena viu Jesus Ressuscitado, recebeu d'Ele a missão de comunicar a Boa Notícia aos discípulos e foi correndo ao encontro deles. E sabe o que aconteceu? Os discípulos tiveram dificuldade de acreditar nela. Julgaram ser tudo isso um delírio e não lhe deram atenção como narra o Evangelista João (cf. Jo 24, 11).

Eles tinham lá suas razões. Claro que lendo a narrativa nos dias de hoje, parece-nos um absurdo eles não terem acreditado na mesma hora e terem tomado parte da alegria de Madalena, mas pensemos no contexto. Eles estavam inseguros, o Mestre em quem confiavam e esperavam que libertasse Israel havia sido crucificado e já fazia três dias. Estavam decepcionados e a decepção endurece o coração e o fecha à graça das novidades. Não tinham mais referências, e só o que já passou pela dor da perda sabe como é difícil acreditar de novo quando tudo parece perdido.

Nessas horas, as palavras pouco resolvem, é preciso tempo, testemunho, decisão e amor para voltar a crer e contemplar milagres. Testemunho eles tinham, Madalena estava ali de viva voz afirmando: "Eu vi o Senhor!" Não há comentários sobre a insistência dela para que acreditassem no que dizia, mas imagino que não se deteve nisso. Naquela hora, mais importante do que acreditarem em suas palavras, era seu entusiasmo e a alegria em ter reencontrado o Mestre vitorioso, vencedor da morte!

E os discípulos? Como vemos na Sagrada Escritura, também tiverem seu momento de encontro com o Senhor Ressuscitado e acreditaram decididamente n'Ele, o ponto de a maioria deles ter dado a vida pela causa do Mestre. Mas foi a força revolucionária do amor que levou Maria Madalena, ainda de madrugada, ao sepulcro e a fez primeira testemunha da ressurreição. Porque o amor vence o medo, ultrapassa os preconceitos da razão, vai além das palavras e leva à ação. Maria Madalena e tantos outros seguidores de Jesus fizeram esta experiência e se tornaram sinais da Sua presença neste mundo.

Que hoje a luz de Cristo Ressuscitado ilumine nossos corações e nos faça também testemunhas da Sua Ressurreição a partir da nossa decisão de amar como Cristo nos amou. Esta força, sim, pode revolucionar o mundo!

Dijanira Silva

domingo, 15 de abril de 2012

O lugar do cristão...

Não existem portas fechadas que não possam ser superadas...

O Cristianismo se espalhou a partir de um grupo de discípulos escolhidos por Jesus, cuja missão desafiadora era desproporcional às suas capacidades humanas. O ambiente judaico da época e o poder romano, que dominava o quadro cultural em que se encontravam, não lhes eram propícios para divulgarem a Boa Nova do Evangelho. No entanto, pessoas limitadas se puseram a falar de Jesus Cristo e a proclamar que Ele está vivo. A perseguição desencadeada nos anos que se sucederam provocou a chamada “diáspora”, dispersão que se revelou providencial, pois fez com que o Evangelho chegasse a rincões mais distantes. Até hoje, cada situação adversa é oportunidade – Kairós – aproveitado por Deus, para novas oportunidades para testemunhar o nome de Cristo. O resultado aí está, com a presença da Igreja em toda parte, malgrado todas as dificuldades encontradas no correr dos séculos.

Já nos primeiros séculos, escritores cristãos deixaram o testemunho do caminho seguido para o crescimento da Igreja: “Depois de receberem a força do Espírito Santo com o dom de falar e de realizar milagres, os apóstolos começaram a dar testemunho da fé em Jesus Cristo na Judéia, onde fundaram Igrejas; partiram em seguida por todo o mundo, proclamando a mesma doutrina e a mesma fé entre os povos. Em cada cidade por onde passaram fundaram Igrejas, nas quais outras Igrejas que se fundaram e continuam a ser fundadas foram buscar mudas de fé e sementes de doutrina. Por esta razão, são também consideradas apostólicas, porque descendem das Igrejas dos apóstolos.

Apesar de serem tão numerosas e tão importantes, estas Igrejas não formam senão uma só Igreja: a primeira, que foi fundada pelos apóstolos e que é origem de todas as outras. Assim, todas elas são primeiras e apostólicas, porque todas formam uma só. A comunhão na paz, a mesma linguagem da fraternidade e os laços de hospitalidade manifestam a sua unidade. Estes direitos só têm uma razão de ser: a unidade da mesma tradição sacramental” (Do Tratado sobre a prescrição dos hereges, de Tertuliano, presbítero, capítulo 20 – Século III). A “certidão de nascimento” de uma comunidade cristã é dada pelo laço da sucessão apostólica, que a liga aos primórdios da fé cristã.

Nosso tempo é de pluralismo, por isso exige testemunho mais qualificado dos cristãos. A Igreja pede, em sua oração, que no tempo da renovação da festa pascal, quando o Senhor reacende a fé em Seu povo, estes compreendam melhor o batismo que os lavou, o Espírito que lhes deu nova vida e o Sangue que os redimiu (Cf. Oração do dia do Segundo Domingo da Páscoa). É que não lhes é lícito esmorecer diante de qualquer situação. Antes, cabe-lhes exercitar a criatividade suscitada pelo Espírito Santo a fim de fermentarem de novo e sempre os ambientes em que se encontram.

Após a Ressurreição, o Senhor Jesus Cristo apareceu aos Apóstolos (cf. Jo 20,19-31), estando “as portas fechadas”. Comunicou-lhes Sua paz, confirmou-lhes a fé, fazendo-os superar o medo das chagas – agora gloriosas! – entregou-lhes a missão de serem portadores da misericórdia infinita com que quer restaurar a vida dos homens e mulheres de todos os tempos com o sacramento do perdão. Enfim, deu-lhes “instrumentos de trabalho”. Dali para frente, as mudas da fé foram plantadas em toda parte e não existem portas fechadas que não possam ser superadas. Não é necessário nem conveniente ou permitido usar as armas da violência, do engodo ou da mentira. Basta anunciar Jesus Cristo, pois só Ele pode converter os corações.

Formaram-se as primeiras comunidades cristãs (Cf. At 2, 42-47; At 4, 32-35; At 5,12-16), como relatam os Atos dos Apóstolos. Perseverança na escuta da Palavra de Deus, na Oração, na Eucaristia e na Partilha dos bens. E em toda a sua história, a Igreja constatou que os bens, quando partilhados, se multiplicam. É a lógica de Deus, diferente do que o senso comum possa oferecer! Todas as gerações de cristãos se descobriram chamadas à fraternidade, lenir as chagas e suscitar obras com as quais os mais frágeis da sociedade são por eles acolhidos e promovidos. Venha à luz, de forma especial, o que os cristãos fazem, ao lado de outras forças da sociedade, para defender a vida do nascituro, ou a Pastoral da Criança, as grandes obras de acolhimento às pessoas com necessidades especiais ou as instituições que cuidam da saúde dos mais pobres.

E em tempos como o nosso, em que o valor da vida é vilipendiado e a verdade relativizada, continua verdadeira a afirmação do Apóstolo São João: “A vitória que vence o mundo é a nossa fé” (I Jo 5,4). Vitória para o cristão não é a destruição do adversário! É que, amado, este se transforma! Os valores pelos quais lutam os cristãos são o que existe de melhor para a humanidade! Não a destroem ou impedem a felicidade. Eles são chamados a ser diferentes, mas para melhor, no rumo de realização plena para todos, sem exceção.

Dom Alberto Taveira Corrêa

domingo, 8 de abril de 2012

Páscoa, festa da Vida e da Luz...

“Exulte o céu, e os Anjos triunfantes, mensageiros de Deus, desçam cantando; façam soar trombetas fulgurantes, a vitória de um Rei anunciando”.

É assim que a Igreja celebra o anúncio da vitória da Vida sobre a morte, da Luz sobre as trevas: Cristo Ressuscitou, Aleluia! No céu se realiza essa grandiosa festa entre os anjos que, cumprindo a missão a eles confiada, descem para a terra e comunicam aos homens essa linda realidade. A festa do céu chegou até nós! Aquele que estava morto vive! O fogo novo do Círio Pascal entra na igreja ainda escura para mostrar essa vitória da vida sobre a morte.

A luz nova que entra na igreja é o sinal da Luz de Cristo que também chega até os nossos corações. Todos são iluminados, só precisamos deixar que essa Luz Verdadeira penetre o mais profundo em nosso ser, dissipando qualquer sombra e erradicando em nós as raízes da vida velha. A Páscoa é muito mais que a “festa do chocolate”. Para nós, resgatar o verdadeiro sentido desta solenidade é questão de crescimento na nossa identidade de cristãos autênticos.

A ressurreição de Cristo dá o sentido de todas as outras festas cristãs, enche de esperança os sofrimentos e inaugura um tempo novo de crescimento rumo à realização do projeto de Deus também para nós. Aquele que morreu por nós, também por nós ressuscitou, para deixar claro que esse projeto do Pai também se realizará nas nossas vidas.

Feliz Páscoa!

Deus o abençoe.

Monsenhor Jonas Abib

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Sexta-feira da Paixão:Mistério de amor...

'Nada o detém na sua entrega amorosa...'

Vamos começar nossa reflexão a partir das palavras que São João usa para sintetizar o que aconteceu na Última Ceia e na Paixão de Jesus: “Tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim” (Jo 13, 1).

Amar até o fim significa que, no caminho da sua entrega por nós na Cruz, Jesus seguiu todas as etapas, sem deixar uma só, e chegou até o final. As penúltimas palavras que pronunciou na Cruz foram: “Tudo está consumado” (Jo 19, 30), antes de clamar: “Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito!” (Lc 23, 46).

Mas amar até o fim também significa que Cristo, na Cruz, nos amou sem limite algum, sem recuo algum, sem poupar-se em nada, até ao máximo extremo. Nada limitou o seu amor. Não se deteve em barreiras, não o arredou nenhuma dor, nenhum sacrifício, nenhum horror. Acima do seu bem-estar, da sua honra, da sua vida, colocou a salvação dos que amava, de cada um de nós.

Já pensamos no que é um amor ilimitado? Um amor que não depende de nada, nem exige nada, para se dar por inteiro?

O amor de Cristo começa sem que nós o tenhamos amado, não é retribuição, é puro dom; e chega até ao extremo ainda que nós não correspondamos, melhor dizendo, no meio de uma brutal falta de correspondência. Nisto consiste o amor – esclarece São João –: “não em termos nós amado a Deus, mas em que Ele nos amou primeiro e enviou o seu Filho para expiar os nossos pecados” (1 Jo 4, 10).

A meditação da Paixão, neste sentido, é transparente. Nenhum sofrimento físico aparta Jesus da Cruz. Basta que contemplemos – como numa sequência rápida de planos cinematográficos – Jesus preso, amarrado, arrastado indignamente, esbofeteado, açoitado até a sua carne se converter numa pura chaga, coroado de espinhos, esfolado e esmagado sob o peso da Cruz, cravado com pregos ao madeiro, torturado pela dor, pela sede, pelo esgotamento... Nada o detém na sua entrega amorosa.

Podemos projetar também – em flashes consecutivos – a sequência dos seus sofrimentos morais, e perceber que tampouco conseguiram afastá-lo de chegar até ao fim. É caluniado, ridicularizado, julgado iniquamente, condenado injustamente; alvo de dolorosa ingratidão, de hedionda traição; é ferido pela infidelidade, pela falta de correspondência dos que amava e escolhera como Apóstolos; é atingido pelas troças mais grosseiras, pelos insultos mais ferinos, por escarros e tapas no rosto...

Nada o faz recuar, nem sequer a última humilhação, pois não o deixaram morrer em paz, e desrespeitaram com zombarias e insultos os últimos instantes da sua agonia. Os que passavam perto da Cruz sacudiam a cabeça e diziam: “Se és o Filho de Deus, desce da cruz!”

Os príncipes dos sacerdotes, os escribas e os anciãos também zombavam dele: “Ele salvou a outros e não pode salvar-se a si mesmo! Se é rei de Israel, desça agora da cruz e creremos nele; confiou em Deus, que Deus o livre agora, se o ama...” (Mt 27, 39-43). Esta doação sem limites de Cristo é o Amor que nos salva, o caminho que Ele quis escolher para nos livrar do mal, afogando-o em si – no seu Amor – como num abismo.

Ao mesmo tempo, é um contínuo apelo ao nosso amor. “Quem não amará o seu Coração tão ferido? – perguntava São Boaventura –. Quem não retribuirá o amor com amor? Quem não abraçará um Coração tão puro? Nós, que somos de carne, pagaremos amor com amor, abraçaremos o nosso Ferido, a quem os ímpios atravessaram as mãos e os pés, o lado e o Coração.

Peçamos que se digne prender o nosso coração com o vínculo do seu amor e feri-lo com uma lança, pois é ainda duro e impenitente.

Padre Francisco Faus

terça-feira, 3 de abril de 2012

Abra as portas para o Senhor entrar...

'Maranatha! Vem, Senhor Jesus!'

“Levantai, ó portas, os vossos frontões, erguei-vos, portas antigas, para que entre o rei da glória. Quem é este rei da glória? É o Senhor forte e poderoso, o Senhor poderoso no combate. Levantai, ó portas, os vossos frontões, erguei-vos, portas antigas, para que entre o rei da glória. Quem é este rei da glória? O Senhor dos exércitos – é ele o rei da glória” (Sl 23, 7-10).

Nós Te oferecemos, Senhor Jesus Cristo, Redentor do mundo, as chaves de nossa cidade e de nossos corações. Não fazemos mais do que Te retribuir, pois as chaves da inteligência e da vontade nos foram outorgadas pela benevolência com que fomos criados. Feitos para Deus e para olhar para o alto e para frente, queremos recuperar hoje nossa dignidade e dizer-Te que és bem-vindo. Bendito o que vem em nome do Senhor!

Vem falar em nossas praças, Senhor Jesus Cristo, proclamando presente o Reino de Deus. Faze-nos entender Teus mistérios, pois ele chega como luz, sal, fermento, semente que morre para se multiplicar! Ajuda-nos a vê-Lo, cidade construída num lugar alto! Ensina-nos de novo que o Reino está no meio de nós. Grita de novo, Senhor Jesus, o apelo à conversão. Muda nossa mentalidade, Senhor, para Te acolhermos de coração sincero.

Vem entre nós, Jesus Salvador, novo Moisés, proclamar a carta do Reino, o Sermão da Montanha. Vence nossas resistências para acolher a novidade que trazes. Vem fazer-nos pobres em espírito,para acolhermos o Reino. Vem fazer-nos chorar com os que choram. Vence nossas agitações com Tua mansidão, que faz vir a terra em herança para Teus amados. Dá-nos fome e sede de justiça. Dá-nos pureza de coração para ver a Deus! Faze-nos promover a paz, pois nos chamaste a sermos filhos de Deus.

Recebe, Senhor Jesus, as cândidas aclamações de nossas crianças. Dá-nos preservar nelas a simplicidade e a pureza. Faze com que se transformem em multidão de hosanas. Venha qual rio em tempo de cheia a torrente esperançosa de nossos jovens inquietos. Que eles Te busquem e Te recebam, Senhor! Vem ao encontro do desejo do bem que existe em seus corações. Faze-os superar a avalanche da maldade e do egoísmo que pretende engolir suas boas intenções!

Entra em nossas casas, Senhor, como entraste na casa de Simão Pedro para levar a cura! Vem tomar refeição em nossa casa, para pôr às claras nossos julgamentos, como fizeste na casa de outro Simão. Deixa-nos abrir os telhados para que Te encontrem os paralíticos de todas as doenças do corpo e da alma. Vem para a mesa da amizade, na Betânia de nossas famílias, e faze-nos Marta e Maria para achegar-nos a Ti. Vem transformar, em nossas famílias, a água no vinho novo da festa do Reino de Deus, como em Caná!

Vem encontrar, Senhor Jesus Cristo, as pessoas inquietas que a portas entreabertas Te querem conhecer e suplicam que alguém as conduza a saudar-Te e ouvir-Te dizer: “Ninguém te condenou? Nem eu te condeno! Vai e não peques mais!” Seja-lhes concedido superar a vergonha pelos pecados cometidos, para a festa do abraço da misericórdia.

Vem, Senhor, percorrer nossas ruas, para encontrar os andarilhos e aqueles que dormem às portas de nossas casas comerciais. Ensina-nos a dizer-Te com eles que somos cegos à beira do caminho e queremos ver-Te. Convence-nos, Jesus de bondade, a deixar-nos lavar da sujidade de nossas misérias na piscina de Tua bondade infinita, que nos leva a tomar nas mãos, um dia depois do outro, os leitos em que jazemos. Lava todas as maldades de nossa terra, Senhor Jesus!

Vem, ó Filho de Davi, realizar as esperanças dos séculos que Te aguardaram e preparam Teus caminhos. Glória, louvor e honra a Ti, Cristo Rei, Redentor. Sobe a Ti nosso piedoso Hosana e o clamor dos pequenos. Veio a Ti o povo hebreu, com seus ramos e suas palmas. Avance pelas nossas ruas o cortejo daqueles que Te celebram, trazendo os hinos e aclamações (Cf. Liturgia do Domingo de Ramos).

Vem tomar posse de nossa terra para que Te pertençam o povo e as casas, os palácios e os casebres! Sejam iluminados os meandros mais escuros de nossas almas para que tudo seja dia, como naquela Jerusalém celeste, onde Tu serás a luz verdadeira. Nela não entrará nada de impuro, nem alguém que pratique a mentira, mas somente os que estão inscritos no livro do Cordeiro (Cf. Ap 21,22-27).

Vem, Senhor Jesus! Vem, Jerusalém do alto, esposa do Cordeiro! Venha o que é novo, Venha o Senhor, Salvador e Redentor! Bendito o que vem em nome do Senhor!

Dom Alberto Taveira Corrêa